Bukowski entenderia

Postado por Rhaiza Oliveira , sábado, 30 de junho de 2012 20:39


Ela pinta os lábios pra escrever.  Acende o incontável cigarro do dia enquanto escarra pro papel. Os olhos inchados pela alergia da troca de clima.
Ainda pareceria sexy pra qualquer um que olhasse. Tinha um jeito de tragar que a comparava a Bardot. Mas sem a elegância, ela era uma mistura de um moleque de 10 anos com uma velha depravada e feminista, como Simone.
‘Sartre sempre foi um sofredor. Simone tinha seus passatempos e ele agüentava por amor’, ela falava nas rodas de bar que deveria existir um Sartre para cada mulher, que experimentaria outros Sartres de mulheres que não ligariam de dividir.

Sentia-se dividida. O filho dormia no berço enquanto ela via ‘Quanto mais quente melhor’ e sonhava com Marylin e seu batom vermelho com pintinha no canto da boca. Conseguia arrancar picos de felicidade com o sorriso do filho, os filmes das divas que sonhava em ser e as doses de uísque nos bares.
Uísques esses seguidos da mesma pergunta: ‘O que uma mulher tão doce e com olhos tão tristes faz num bar sujo desse com bebida de homem?’. Ela tinha vontade de mandá – los à merda, à puta que os tinham parido. Mas alegrava os olhos como podia, sorria o sorriso amarelo de inúmeros goles e tragos e pedia um Martini por conta do jovem galanteador.
Trepava como ninguém. Nisso parecia com Marylin. O filho tinha feito o corpo mudar, mas a boca e a boceta ainda arrancavam rios de sêmen e gemidos. Quase nunca gozava, mas quando acontecia explodia em um riso estranho e meio moleque. Gostava da cara do escolhido quando isso acontecia num misto de ego inflado e estranhamento. Quando não gozava, gostava de ver como os humilhava, naquele esforço de ouvir a risada que já tinham ouvido a respeito.  Era um Bukowski de saias, no eterno papel de dominador e dominada.

Bukowski entenderia mesmo. Tomaria umas boas doses com ela e depois recitaria ‘Bluebird’ e ririam juntos, pois os dois saberiam exatamente do que se tratava: Há um pássaro dentro de mim, que quer sair, mas eu o agonizo com cigarro e bebida...
Sentia falta da época de colégio, do estômago liso, sem estrias, olhos felizes. ‘Mas talvez seja esse o meu charme, estar acabada... ’ e voltava a maquiar – se para mais uma sessão de bebida e galanteios.
Pagou metade do dinheiro da babá, pôs – se em seus saltos e foi para a vida. Ser Simone, ser Bukowski, ser Marilyn e ser puta. O papel que ela mais sabia ser. No radio do carro, ele recitava: ‘There‘s a bluebird in my heart that wants to get out...’
Sorria. Quem sabe um dia, Buk, quem sabe um dia…



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